Os frutos do rico
O maior contrabandista de armas da Amazônia
"Rômulo Maiorana morreu em abril de 1986, aos 64 anos, de leucemia. A partir de então, os sete filhos de Rômulo, que o sucederam, sob a presidência honorária da mãe".
Belém
sempre foi uma cidade bem acolhedora. Na primeira metade do século
passado, colhia os frutos do rico ciclo da borracha do final do século
XIX, que proporcionou uma transformação na cidade, com a construção de
palacetes, igrejas, grandes praças com lagos e chafarizes, calçamento de
vias com pedras de lioz (importadas da Europa) e o ajardinamento das
avenidas com mudas de mangueira importadas da Índia. Tudo ao estilo da
arquitetura francesa.
Belém era conhecida como a “Paris dos
Trópicos” e atraía todo tipo de gente, de todo tipo de lugar. Procuravam
na cidade oportunidades de crescimento, como nos Eldorados. Naquela
época, surgiram algumas fortunas na capital que hoje se encontram na
segunda ou terceira geração.
Nessa época, o principal produto de
exportação do Brasil era o café. Em Belém existiam casas de torrefação -
na sua maior parte de fachada - que serviam para escamotear o
contrabando. Nesses locais, parte do café era contrabandeado para
cidades como Paramaribo e Caiena. Além do café, os contraventores também
“exportavam” babaçu, cera de carnaúba, pedras preciosas, areia
monazítica e vários produtos da floresta. No retorno dos navios, os
contrabandistas recebiam produtos variados como carros, bicicletas,
rádios, geladeiras, uísque, roupas, tecidos e até armas.
O volume do contrabando no Pará era tamanho –
envolvendo empresários e inclusive políticos – que chamou a atenção da
imprensa nacional na época. O jornal “O Globo” destacou o jornalista
José Leal para investigar a fundo essa forma de contravenção em nosso
Estado. O jornal publicou uma série de 22 artigos entre os dias
25/2/1957 e 23/3/1957 denominada “Um repórter na Rota do Contrabando”,
onde o jornalista Leal desnudou as rotas, os esquemas e os mentores do
contrabando no Estado do Pará.
Após intensa investigação, José Leal
conseguiu identificar alguns nomes que realizavam esse tipo de
contravenção através dos rios.
ARMAS
ARMAS
Publicado em 14/3/1957 na página 10 do
jornal “O Globo”, o 14° artigo de José Leal tratou sobre o contrabando
de armas. O jornalista se mostra surpreso com a notícia – provavelmente
dada por uma fonte – de que em Belém estavam sendo vendidos revólveres
contrabandeados. “Era, para mim, uma novidade, pois até aquela data
(recebeu a informação em dezembro do ano anterior) havia entrado
clandestinamente no Pará toda espécie de mercadorias, procedente de
Paramaribo, com exceção de armas...”Leia mais...
Em seguida, o jornalista diz que descobriu
toda a verdade através de uma brincadeira: ele encontrara no Grande
Hotel um homem chamado Paulo Freire, que seria sobrinho de Victorino
Freire, que trabalhava como secretário num banco em Belém. No texto,
Leal dá a entender que Paulo contrabandeava uísque e que, “brincando”,
lhe disse que não estava mais no ramo dos destilados. “Agora estou
vendendo isto”, disse Paulo ao jornalista, tirando da cintura “um lindo
revólver calibre 32, oxidado, cabo de nogueira”.
Espantado, José Leal indagou a Paulo onde e
como havia adquirido tal arma. “Um amigo meu acaba de regressar dos
Estados Unidos e trouxe uma partida de cem”, confidenciou o secretário
do banco ao jornalista, que imediatamente se mostrou interessado,
dizendo a Paulo que tinha uns amigos no Rio de Janeiro que lhe haviam
pedido para comprar uns revólveres. Paulo disse que falaria com seu
“amigo” para lhe procurar à noite. A seguir, reproduzimos “ipsi literis”
trecho do artigo de José Leal que narra o encontro:
“Realmente: à noite apareceu no hotel um
moço bem vestido, insinuante, delicado e, pelo que pude deduzir de suas
primeiras palavras, muito ladino. Era Rômulo Maiorana, dono de uma
agência de propaganda em Belém, pernambucano de nascimento, que esteve
na Europa durante a guerra, tendo trabalhado na Itália numa repartição
do Exército americano. Estivera em Paris e noutras capitais do Velho
Mundo, e agora se encontrava em Belém, onde faz a coluna social do
matutino ‘O Liberal’. Explicou-me que, no Pará, lutou a princípio com
certas dificuldades, mas que finalmente vencera e superara todas as
crises, estando no momento com uma situação financeira equilibrada.
Adiantou-me ainda que se tornara colunista social por uma questão de
conveniência:
- No Pará, é o melhor trampolim do mundo para a gente fazer bons negócios...(sic)
Finalmente, confessou que regressara havia
pouco dos Estados Unidos e resolvera trazer armas, máquinas de escrever,
rádios, etc. Mas não disse como desembarcara essas mercadorias.
Salientou, isto sim, que só trouxera o que fora possível trazer
legalmente. Quase dei uma gargalhada quando me falou em “legalmente”.
Como sabem os leitores, a venda de armas nos Estados Unidos é
severamente controlada, e sua saída do país exige uma série tão
complicada de formalidades que somente os comerciantes estabelecidos no
estrangeiro, com licença inclusive do Exército, podem importar
revólveres. E Rômulo Maiorana não é comerciante estabelecido com
autorização para fazer esse tipo de comércio. Sendo severamente
controlada, a saída de armas só se torna possível nos Estados Unidos por
meios clandestinos, isto é: o indivíduo compra essas armas
clandestinamente. A verdade é que Rômulo Maiorana se tornou
contrabandista de revólveres para o Brasil. Ali, naquele momento mesmo,
disse-me que da partida trazida restavam apenas 53 revólveres que
estavam à minha disposição pelo preço de 9 mil cruzeiros cada um.
Respondi-lhe que o preço era muito alto. Iria passar um telegrama para
determinada pessoa no Rio e no dia seguinte lhe comunicaria a minha
decisão.
A verdade, leitores, é que Belém foi
inundada de revólveres. Podia-se comprar uma arma na calçada dos hotéis,
no bar, na rua, sem o conhecimento da polícia, que nenhuma providência
tomou, embora sabendo quem os tenha trazido e quem os estava vendendo.”
Rômulo Maiorana era pernambucano e
filho de italianos, chegou a Belém em 1953, com 31 anos. Tentou alguns
negócios, como fabricar placas indicativas de ônibus, flâmulas e painéis
luminosos, antes de começar a montar uma rede de sete lojas de
vestuário e calçados. Sempre exerceu paralelamente a função de colunista
sócial, primeiro em “O Liberal”, jornal fundado em 1946, para ser o
porta-voz do partido mais forte do Estado Partido Social Democrático
(PSD), controlado por Magalhães Barata.
Barata foi interventor federal no Pará em 1930, voltou a ser interventor durante a grande guerra e em 1953 era senador, preparando-se para disputar – e vencer – a primeira disputa como governador eleito pelo voto popular, em 1955. Sua principal ameaça era um jornal, a “Folha do Norte”, fundado ainda no século XIX, e seu dono e principal redator - de estilo violento -, Paulo Maranhão.
Barata foi interventor federal no Pará em 1930, voltou a ser interventor durante a grande guerra e em 1953 era senador, preparando-se para disputar – e vencer – a primeira disputa como governador eleito pelo voto popular, em 1955. Sua principal ameaça era um jornal, a “Folha do Norte”, fundado ainda no século XIX, e seu dono e principal redator - de estilo violento -, Paulo Maranhão.
Além de escrever uma coluna no jornal
de Barata, Rômulo passou a namorar uma sobrinha do general, Lucidéia,
mais conhecida como Déa, jovem bonita e que nas altas rodas da sociedade
paraense era conhecida por um modo de vida nada ortodoxo para a moral
conservadora da época.
Segundo artigo publicado no portal
Adital
(http://www.adital.com.br/site/noticia2.asp?lang=PT&cod=18968), em
setembro de 2005, pelo jornalista Lúcio Flávio Pinto, Rômulo cresceu no
comércio e multiplicou as Lojas RM à sombra de Barata, bem como pelo
contrabando que se desenvolvia na cidade. Segundo o jornalista, Belém
vivia isolada do restante do país na época. Não dispunha de estradas de
rodagem ou ferrovias para as comunicações com outros estados brasileiros
ou o exterior, que só podiam ser feitas por navio ou avião. “Mas, como
estava às proximidades das Guianas, Belém se abastecia, sobretudo, de
bens duráveis (como automóveis) e de consumo supérfluo (como bebida
alcoólica e perfume), através de um comércio ilegal com seus vizinhos
estrangeiros”.
O contrabando, diz o artigo de Lúcio
Flávio, quebrava o isolamento e, ao mesmo tempo, enriquecia um grupo de
empreendedores mais audaciosos – ou mais próximos do poder político, que
daria cobertura às suas aventuras. Rômulo fazia parte desse grupo”.
Em março de 1960, o governador do
então Estado da Guanabara (hoje a cidade do Rio de Janeiro), o udenista
Carlos Lacerda, incluiu o nome de Rômulo entre contrabandistas de Belém
numa entrevista dada à televisão e reproduzida nos jornais. Em 1974, o
“outro lado” do patriarca dos Maiorana foi lembrado pelo jornal “A
Província do Pará”, numa série de editoriais.
Ainda segundo o jornalista José Leal,
as armas contrabandeadas chegavam por meio de aviões vindo do exterior e
que pousavam em Val-de-Cans. “...quando chega ao fim da pista,
justamente no momento de fazer a curva e taxiar rumo à estação de
passageiros, o comandante, que sabe da história e ganha a sua parte,
acelera os motores do aparelho, que já está com a portinhola aberta.
Nessa ocasião, a aeromoça, que também faz parte da quadrilha, tem apenas
o trabalho de empurrar com um dos pés o caixote com 100 ou 200
revólveres. Ninguém ouve o barulho do choque da caixa com o solo por
causa do ronco dos motores. Dentro do mato estão escondidos os homens
encarregados de transportar os pequenos volumes para um jipe, que some
na estrada que vai para a cidade”, narrou o jornalista. Quem inaugurou o
contrabando desse tipo de armas, segundo o jornalista, teria sido o
agente da Real Aerovias chamado Salgado.
E prossegue José Leal: “Desse modo,
ficam os leitores sabendo que em Belém até o colunista social é
contrabandista; que até um alto funcionário da Real Aerovias vive fora
da Lei, sem precisar disso”.
A notícia do jornal “O Globo”, um dos
maiores jornais do país e que integra as Organizações Globo, cuja
programação é transmitida aqui no Pará pela TV Liberal, de propriedade
da “famiglia” Maiorana, mostra de que forma começaram os negócios do clã
Maiorana no Estado do Pará e de como o patriarca da família ganhava a
vida e fez fortuna na década de 50 do século passado: de dia, era um
reles colunista de jornal. À noite, percorria os ambientes mais
sofisticados das cidades das mangueiras oferecendo armamento
contrabandeado. Com os lucros da contravenção ficou rico e, mais tarde,
com a ajuda de pessoas influentes, compraria o jornal “O Liberal” e a TV
Liberal.
A revelação, acima de tudo, corrobora o
que o próprio filho de Rômulo Maiorana, Rômulo Maiorana Jr., chefe
atual do clã dos Maiorana, revelou em editorial de baixo nível assinado
pelo próprio e publicado na capa edição de seu jornal no dia 20 de maio
passado: “Ora, se ele foi contrabandista, foi para dar comida a sete
pessoas, a sua família (sic)...”. Não resta dúvidas de que, para a
família Maiorana, os fins justificam os meios.
Pela ótica de Rominho, criminosos e
assassinos como Nem da Rocinha e Fernandinho Beira-Mar estariam
coonestados, isto é, seriam honestos e decentes, como Rômulo Maiorana, o
pai, que o dinherio fosse usado para a família.
Após o “baratismo” ter sido
derrotado pelo movimento militar eclodido no Brasil, em 1964, que depôs o
presidente João Goulart e acabou com o populismo, o sistema nacional de
poder estabelecido a partir do ditador Getúlio Vargas, Rômulo fechou
abruptamente sua cadeia de lojas, famosas na cidade, e comprou, em 1966,
o jornal “O Liberal”.
Em 1976, ele inaugurou a TV
Liberal, montada em apenas oito meses, para se tornar afiliada da TV
Globo. Mas, segundo Lúcio Flávio, Rômulo não pôde colocar a emissora em
seu nome, embora fosse seu dono. “Os órgãos de informação ainda
mantinham em sua ficha a nódoa do contrabando. O regime militar ainda
estava no movimento afluente do seu moralismo. Não concordava em
transferir para alguém tido como ex-contrabandista uma concessão
pública, o canal de televisão”, relata.
Rômulo teve que colocar a
concessão no nome de cinco funcionários, reavendo-lhes a ação depois,
quando seus serviços prestados ao governo haviam limpado definitivamente
seu nome dos arquivos da “comunidade de informações”.
Rômulo Maiorana morreu em abril
de 1986, aos 64 anos, de leucemia. A partir de então, os sete filhos de
Rômulo, que o sucederam, sob a presidência honorária da mãe. Diario do Pará.
EU ADORAVA O PAI DE RÔMULO, A QUEM CHAMAVA DE VOVO MAIORANA, DONO DA CASA VESÚVIO,
ResponderExcluirNA RUA JOÃO PESSOA, AQUI EM NATAL/RN.
SAUDADES DELE, MUITAS!
Que conto !!! Romulo foi um vencedor, guerreiro amigo dos amigos, Conheci e vivi de perto boa parte de sua vida na compra do jornal ele entrou sem um real foram 100 promissorias. O Osean Brito que tinha um irmão coronel é que consegui intervir junto á Globo para a concessão do canal de repetidora da Globo.Romulo ajudou a muita gente deu trabalho condições era de visão . Merece mais respeito !!
ExcluirSERGIO MEIRELES NIBON