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domingo, 21 de abril de 2013

Ações pedem garantias a terras e povos indígenas


O Ministério Público Federal (MPF) do Pará ajuizou duas ações civis públicas para garantir terras que povos tradicionalmente ocupam. Além disso, expediu recomendações para instituições públicas e empresas privadas. A primeira ação enfoca o descumprimento das medidas de proteção das áreas indígenas que serão afetadas pela construção da usina hidrelétrica de Belo Monte. As medidas deveriam ter sido providenciadas pelos responsáveis pelo empreendimento, mas, como foram descumpridas, “submetem hoje os povos indígenas do Médio Xingu à situação limítrofe de um etnocídio”, denuncia o texto da ação. 
Assinada pelos procuradores da República Thaís Santi Cardoso da Silva, Meliza Alves Barbosa, Ubiratan Cazetta e Felício Pontes Jr, a ação pede à Justiça, entre outros requerimentos, a suspensão da licença de instalação da hidrelétrica até que sejam executadas as medidas indispensáveis à proteção das terras indígenas, como a construção de 21 unidades de proteção territorial e a contratação e capacitação de agentes para atuar nessas unidades. Os réus nesse processo são a Norte Energia, responsável pela obra, a Fundação Nacional do Índio (Funai) e o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama).
A outra ação, onde figuram como réus a União e a Funai, cobra a demarcação das terras de Jeju e Areal, do povo Tembé, localizadas em Santa Maria do Pará, no nordeste do Estado. O MPF pede à Justiça que obrigue a União e a Funai realizar a demarcação e a desintrusão de eventuais posseiros que se encontrem na área. O procurador da República Felício Pontes Jr. solicitou, ainda, que União e Funai sejam condenadas a pagar indenização de R$ 19 milhões aos indígenas por danos morais coletivos.

Ainda em relação à proteção às áreas indígenas, no Pará o MPF comemora a vitória obtida no Tribunal Regional Federal da 1ª Região (TRF-1). A partir de recurso dos procuradores da República Fernando Antônio Alves de Oliveira Jr., Felipe Bogado e Luiz Antônio Miranda Amorim Silva, o TRF-1 suspendeu a Operação Tapajós, ação militar e policial promovida a mando do governo federal na região habitada pelos índios mundurukus, onde está planejada a usina hidrelétrica São Luís do Tapajós, no oeste do Estado. A área, que já foi oficialmente reconhecida como indígena, aguarda demarcação.

No Pará o MPF também está levando esses temas para as salas de aula. Os procuradores da República Felipe Bogado e Melina Alves Tostes divulgaram para as secretarias de educação de todos os municípios das regiões de Santarém e Marabá a cartilha sobre direitos indígenas produzida pela 6ª Câmara de Coordenação e Revisão do MPF.

A necessidade de proteção das terras ocupadas por diversas etnias do Xingu, segundo os procuradores se faz urgente. Os índios estão vulneráveis a invasões de suas terras para exploração ilegal de madeira e minério. Para o MPF, a construção de Belo Monte é, hoje, um desafio ao estado de direito brasileiro, “um processo de licenciamento que nos lança à temível realidade de um direito flexível, em que a norma jurídica não se aplica, mesmo quando demonstrado o seu precedente. Ou melhor, não precisa se aplicar, porque interesses maiores estariam sendo buscados”. 

Por conta disso, o MPF argumenta que a falta de cumprimento de condicionantes – exigidas para o licenciamento da obra, feita pelo Ibama - que mitigariam os impactos sociais e ambientais da construção da usina, principalmente sobre os povos indígenas, tornam esses grupos que habitam a região do Médio Xingu mais vulneráveis e na “situação limite de um etnocídio”. Os procuradores afirmam que é necessário compreender que o território indígena abarca noção que suplanta o conceito civilista de moradia, terra e propriedade.

“É liame de preservação e garantia da identidade coletiva de um grupo étnico detentor de um modo peculiar de vida, para o qual, a terra está estreitamente relacionada com as suas tradições e expressões, costumes e línguas, suas artes e rituais, seus conhecimentos e usos relacionados com a natureza, culinárias, seu direito consuetudinário, vestimenta, filosofia e valores. Em função de sua integração com a natureza e história, os membros das comunidades indígenas transmitem de geração em geração este patrimônio. Vulneradas territorialmente as terras, a identidade coletiva é posta em risco”, dizem os procuradores. 

PRESSÕES

Estudos divulgados pelo Instituto do Meio Ambiente e do Homem da Amazônia (Imazon) em 2012 confirmam que a terra indígena Cachoeira Seca do Iriri, por exemplo, aparece como a terceira área indígena com maior perda absoluta de floresta original entre 2009 e 2011 de toda a Amazônia Legal. A intensificação das atividades de extração ilegal de madeira confirma a previsão de aumento da pressão sobre os recursos naturais dos índios da região, fato já previsto pela própria Funai no estudo de impacto ambiental (EIA), dando origem a condicionantes relativas a retirada de invasores de terras indígenas.

Outras áreas, já homologadas e registradas, também têm sofrido grandes pressões, como a dos índios arara que, nesses últimos anos, voltou a ser explorada ilegalmente de forma quase contínua. Em 2012, a Polícia Federal realizou quatro ações de fiscalização. Contudo, a rapidez do processo de extração, que dura no máximo uma semana, aliada à ausência de equipes em campo, próximo ao local dos ilícitos, dificulta a autuação em flagrante dos criminosos, e a possibilidade de combate desta prática criminosa. 

Outra reserva atacada por invasores é a Bacajá, cuja área sofre intensa pressão de madeireiros. O local faz limite com vários projetos de assentamento e grandes fazendas. O aumento populacional na região levou, também, à intensificação da demanda pelos recursos pesqueiros nas áreas indígenas, fato identificado pela ação desenfreada de pescadores, atravessadores, e os chamados ‘regatões’, em praticamente todas as aldeias. Tais pessoas têm sido responsáveis pela disseminação do consumo de álcool e drogas ilícitas, além de haver a suspeita de casos de prostituição.



Clima de tensão envolve aldeias tembé de Areal e Jeju

A ação em favor dos índios tembé deixa claro que os invasores precisam ser retirados do local, onde reina um clima permanente de tensão. A aldeia de Areal fica a aproximadamente 7 km de distância da sede do município de Santa Maria do Pará, localizada em um ramal da rodovia Belém-Brasília. Dois grupos principais que fazem parte dessa comunidade estão localizados próximo do igarapé Conceição , que deságua no rio Maracanã. Já a aldeia de Jeju fica localizada as margens da rodovia Pará-Maranhão, a 5 km de Santa Maria, próximo do rio Jeju afluente da margem esquerda do rio Maracanã. Esta aldeia é a maior comunidade Tembé e convive com sérios problemas fundiários e ambientais. 

As aldeias de Jeju e Areal vivem economicamente de suas roças, da pesca e da agricultura. E quando conseguem arrendar terras para trabalhar plantam mandioca, milho e feijão. Além disso, alguns sobrevivem da pesca e da caça. Desenvolvem ainda alguns projetos próprios como criação de abelhas, criação de galinhas, coleta do açaí e outras frutas.

No que tange à educação, não existem escolas diferenciadas para os indígenas que precisam estudar em escolas “de não índios” sofrendo discriminações por externarem os seus modos de vida, tais como pinturas costumes, culturas e tradições. A saúde segue a mesma linha, os indígenas não possuem um tratamento diferenciado.

Esses índios estão resistindo há mais de um século em suas terras. Não é uma simples resistência. É uma resistência histórica contra a discriminação da sociedade como um todo, tendo o poder público grande parcela de contribuição para que a cultura e as tradições indígenas não sejam valorizadas. É a partir dessa perspectiva que a demarcação das terras indígenas de Jeju e Areal surge como um importante meio de resgatar a essência de suas tradições e de seus costumes, fortalecendo-os. 

Infortúnios

A falta de regularização das terras desses dois grupos de tembés, na avaliação dos procuradores do MPF, implica em toda a sorte de infortúnios enfrentados por eles. Pedem que a União e a Funai sejam condenadas a pagar indenização por danos morais e materiais coletivos, combinado com obrigação de fazer, no sentido de que seja realizada a demarcação física da terra indígena.

A Norte Energia e a Funai informaram que não vão se manifestar sobre as ações impetradas pelo MPF, justificando que ainda não foram notificados pela Justiça. Segundo eles, a manifestação ocorrerá tão logo tenham acesso ao conteúdo das alegações dos procuradores da República.

(Diário do Pará)

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