“Adormecidas” por razões não esclarecidas, ações sobre cassação do senador Beto Faro, do PT, devem ser retomadas, segundo o desembargador Leonam Cruz/Fotos: Divulgação. |
O final do ano passado, a acusação de compra de votos para o senador Beto Faro, do PT, pela empresa Kapa Capital, detentora de contratos robustos com órgãos estaduais, resultou em três ações. Uma no Ministério Público do Trabalho, que resolveu a situação rapidamente, obrigando a empresa a assinar, em 11 de abril deste ano, um termo de ajuste de conduta que fixou oito obrigações com o objetivo de garantir o direito de liberdade política e partidária dos colaboradores da empresa, e ainda estabeleceu o pagamento de R$ 300 mil, reversíveis a entidades sem fins lucrativos.
Devidamente assinado pelo dono da Kapa Capital, Otávio Augusto da Fonseca Pacheco, o TAC, na prática, equivale a uma confissão do que foi investigado pelo MPT e MPF, comprovado em gravação por funcionários: a compra de votos para o então candidato Beto Faro, hoje senador. Na outra instância, a eleitoral, duas ações seguem “engavetadas” - ou correndo sob segredo de justiça, por assim dizer, termo que, neste caso, está longe de ser o adequado.
Desde a última distribuição da Ação de Impugnação de Mandato Eletivo Nº 0600006-56.2023.6.14.0000 no Tribunal Regional Eleitoral do Pará, feita ao juiz Rafael Fecury Nogueira em 23 de março deste ano, a ação não deu mais nenhum passo rumo a um possível desfecho. Antes dessa nova distribuição, o mesmo juiz havia distribuído a ação, em 30 de janeiro deste ano, ao juiz Diogo Seixas Conduru, para quem já havia sido remetida a Representação Especial impetrada pelo Ministério Público Eleitoral, inicialmente sem sigilo e segredo de justiça. Nessa distribuição, Fecury argumenta não ser da sua competência julgar a ação isoladamente.
Bate e volta
Porém, em 22 de março deste ano, dois dias antes do fim do mandato de Diogo Conduru como juiz eleitoral, o primeiro suplente do senador Beto Faro, Josenir Gonçalves Nascimento, famoso pelo hábito de agir cautelosamente, segundo quem o conhece, fez uma solicitação avaliada por jurista fonte da coluna com um “ponto sem nó”, ao demonstrar seu interesse direto no destino da ação.
Sob o argumento de “reunião de feitos”, é Josenir Nascimento quem assina o requerimento ao juiz Diogo Seixas Conduru, para que faça o envio da ação, impetrada pelo Partido Liberal, para juntar-se à representação do Ministério Público Eleitoral, já que as duas ações teriam conexão.
Por alguma razão que não ficou clara no trâmite processual, tudo foi redistribuído novamente pelo juiz Diogo Seixas Conduru em 23 de março, último dia de seu mandato e um dia depois da petição de Josenir Nascimento, feita por meio de seu advogado, de volta ao juiz Rafael Fecury Nogueira, que já havia manifestado em janeiro o declínio de competência para julgar a ação que, desta vez, fica mais de seis meses parada sobre sua mesa, sem qualquer despacho.
Sobre a demora em dar um destino à ação, mesmo já tendo sido cobrado para isso por meio de agravo regimental e pedido de reconsideração, o magistrado explicou à coluna que, como são muitos processos em seu gabinete, ele ainda não havia tido um contato mais detalhado com as ações questionadas para tomar alguma decisão possível.
- Não quero me adiantar ao que vou fazer, mas acredito que este não é julgamento da minha competência, mas sim do plenário da nossa Corte - explicou por telefone.
“Água de poço”
Nesse ritmo de “água de poço”, a demora nas decisões sobre o caso Beto Faro na Justiça Eleitoral fere o que recomenda a própria Lei Eleitoral, que em seu Artigo 97-A, com base na Constituição Federal, considera razoável a duração máxima de um ano para processos que possam resultar em perda de mandato eletivo, contado da sua apresentação à Justiça Eleitoral. A demorada tramitação completará um ano em janeiro de 2024, enquanto a eleição em questão completará um ano no próximo dia 2 de outubro.
Reação do presidente
Independentemente de qual seja a razão, qualquer demora a mais, porém, não tem a concordância do presidente do TRE do Pará, desembargador Leonam Gondim da Cruz Júnior que, em resposta à coluna, informou se trata de uma ação de impugnação de mandato eletivo que só pode ser proposta após a diplomação dos candidatos, o que só ocorreu em janeiro deste ano.
- Esta ação corre sob segredo de justiça. A parte tem que diligenciar e provocar o Poder Judiciário sobre a demora dessa ação respectiva. Eu estou sabendo agora, e, embora não tenha chegado a mim nada, eu já estou cobrando do relator. Há certa celeridade com que temos que julgar essas ações, porque isso está inclusive dentro do meu plano de trabalho, e a sociedade precisa ter uma resposta urgente sobre todas as ações. Então, tenho certeza que vamos julgar isso o mais rápido possível, assim como o que chegar até mim, alguma reclamação da parte interessada, porque o Poder Judiciário é o poder provocado. Eu tomarei as providências necessárias - afirmou.
Ao final de sua fala, o presidente do TRE reafirma que a celeridade nos processos é a mola central de sua gestão, observando, naturalmente, a razoável duração dos feitos que tramitam na Justiça Eleitoral do Pará.
Entenda o caso
A representação do Ministério Público Eleitoral, assinada pelo Procurador Regional Eleitoral Alan Rogério Mansur Silva, teve como origem gravações de uma reunião em que os diretores da empresa Kapa Capital Facilities Ltda., Luiz Fernando e Octávio Pacheco, este último responsável legal pela empresa, recomendam e determinam aos seus funcionários, com todas as letras e mediante dados dos títulos eleitorais dos funcionários, votarem no então candidato do PT ao Senado, Beto Faro, posteriormente eleito e empossado.
Nas gravações da reunião, que foram periciadas pela Polícia Federal e anexadas como provas, é possível inclusive saber que Beto Faro participa da reunião por ligação telefônica via videoconferência. A garantia da Kapa era dar a Faro 1% de votos do eleitorado do Pará. Como fazer isso? Nas falas gravadas parecia bem fácil com o poder da empresa, que à época da eleição, há um ano, tinha nada menos do que 35 contratos firmados com a gestão estadual, incluindo nesse número os respectivos aditivos, totalizando R$ 142,6 milhões, montante registrado nas páginas do Diário Oficial do Estado.
Ao todo, a Kapa Capital era indispensável em dez secretarias e instituições do Estado, entre as quais o Instituto de Previdência (Igeprev); secretarias de Educação (Seduc), e de Trabalho e Renda (Seaster); hospitais Ofir Loyola, Santa Casa e Gaspar Viana; ParáPaz, Adepará, Escola de Governo e Fundação Cultural do Pará.
Após a eleição, diplomação e posse do impugnado Beto Faro, em fevereiro deste ano, a Kapa foi agraciada com alguns contratos novos também com prefeituras, entre elas a rica Prefeitura de Parauapebas, que também pertence ao MDB.
Assédio eleitoral e confissão
Em abril deste ano, após denúncias dos colaboradores, que estavam sob fortes ameaças, a Kapa Capital Facilities assinou um acordo de natureza extrajudicial com o Ministério Público do Trabalho que fixou oito obrigações com o objetivo de garantir o direito de liberdade política e partidária dos colaboradores e o funcionário da empresa. O TAC também estabeleceu o pagamento de R$ 300 mil, reversíveis a entidades sem fins lucrativos.
A denúncia ao MPT também foi feita no final do ano passado pela prática de assédio eleitoral contra os funcionários da Kapa Capital. Dentre os fatos noticiados, estaria o oferecimento promessa de vantagens a trabalhadores que votassem no “candidato da empresa” nas eleições, mediante o envio de foto do título de eleitor.
Além dos R$ 300 mil que a Kapa deveria pagar em seis parcelas, as obrigações do acordo incluem ainda a multa de R$ 100 mil caso a Kapa quebre alguma das cláusulas previstas no TAC, que incluem a proibição à empresa de prometer vantagem dentro do ambiente de trabalho em troca do voto a determinados candidatos; de ameaçar, constranger ou orientar o empregado ao voto; de discriminar pessoas que possuem relações de trabalho em razão de sua orientação política; e de utilizar imagens político-partidárias em bens do ambiente laboral. Ou seja, repetir e reiterar a conduta praticada nas Eleições de 2022 em benefício de um candidato, como ocorreu com Beto Faro, segundo apurou a investigação da Procuradoria Regional Eleitoral.
Também deverá ser garantido aos trabalhadores o direito fundamental de liberdade de orientação política e partidária, bem como publicado nos canais de comunicação da Kapa mensagem ressaltando o comprometimento da empresa com o Estado Democrático de Direito. Outra cláusula muito importante no TAC é a realização de treinamento pela empresa, em períodos próximos às eleições de 2024 e 2026, com o tema de prevenção e combate ao assédio eleitoral.
Confissão de culpa
Segundo fontes do meio jurídico da coluna, a assinatura do TAC pela empresa Kapa e seu sócio configuram confissão e que poderá ser utilizado como fundamento pelo TRE para a cassação do mandato que, ainda de acordo com a acusação contida na Representação da Procuradoria Regional Eleitoral, foi conquistado de maneira ilegal pelo senador Beto Faro.
Olavo Dutra.
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