PF afirma que dólares obtidos com venda ilegal de joias desviadas da Presidência entraram em espécie para o patrimônio de Bolsonaro — Foto: Jornal Nacional/ Reprodução
Áudios, mensagens e diálogos evidenciam rivalidade interna e estratégia de desinformação: “Povo não tem tempo e nem vai entender isso”, disse Wassef ao orientar Bolsonaro a tratar caso como “fake news”.
Além de dezenas de provas de que o ex-presidente Jair Bolsonaro não só tinha ciência como acompanhou o processo de desvio, venda e recompra de joias destinadas ao acervo da Presidência da República, o relatório final da Polícia Federal sobre o caso expõe as entranhas de uma intensa disputa de espaço e protagonismo no bolsonarismo e também da estratégia de desinformação e ataque à imprensa como forma de desviar o foco das apurações.
Num dos áudios mais cristalinos sobre o modus operandi, o advogado Frederic Wassef chega a dizer a Bolsonaro que a defesa precisa ser genérica, tratar o caso como fake news, “sem adentrar em detalhes, em questões de leis e nem nada, porque o povo não tem tempo pra ler e nem vai entender isso”.
Nas mais de duas mil páginas que apenas um dos volumes do processo condensa, fica evidente que, apesar do ataque sistemático à mídia, o grupo mais próximo de Bolsonaro acompanhava notícias da grande imprensa sobre o caso freneticamente, inclusive repassando ao ex-presidente dezenas de menções às diferentes versões da defesa que foram apresentadas ao longo da crise.
Um áudio enviado a Bolsonaro pelo advogado Frederic Wassef demonstra a obsessão pela ocupação de espaços e também a disputa interna pela atenção do ex-presidente.
O contexto é de desavença entre Wassef e o ex-secretário de Comunicação de Bolsonaro, Fábio Wajngarten, que chegou a atuar também como defensor formal do ex-presidente. Wassef tenta convencer Bolsonaro a adotar uma linha de defesa genérica, sem entrar em detalhes sobre o caso das joias.
Segundo ele, dessa forma seria fácil mudar a qualquer tempo a estratégia de defesa —Bolsonaro apresentou ao menos cinco versões sobre os presentes desviados— e também resumir o episódio como “fake news” e “armação”.
“Presidente, eu te mandei só uma pequena amostra das centenas de matérias que explodiram no Brasil inteiro, inclusive, nos Estados Unidos também, que a imprensa americana, eu fiquei sabendo que publicou. [SIC] Então, os principais jornais do Brasil, Folha de São Paulo, Estadão, Globo, UOL, Metrópoles, tudo que você imaginar está a nota na integra, com as mensagens que interessam”, diz Wassef a Bolsonaro no dia 8 de março de 2023, defendendo a nota que ele havia produzido para o caso. O advogado segue:
“Mensagem de massa, para o povo, para o público. Mensagem de subconsciente, que qual que é? ‘Presidente Bolsonaro é honesto! Agiu na lei! Declarou! Isso é armação e fake news. Nunca teve um caso de corrupção em quatro anos de governo!
Isto é perseguição política, procurando pelo em ovo!’”, elabora.
“Esta mensagem simples, curta e grossa é que tem que ir para o público. Sem adentrar em detalhes, em questões de leis e nem nada porque o povo não tem tempo pra ler e nem vai entender isso. A mensagem que é um tiro de canhão que nós falamos tudo que interessava, sem falar nada que compromete a defesa e estratégia de defesa, está aí. Todos estão elogiando! Todos!”, conclui.
No fim, Wassef foi excluído da banca formal de defesa de Bolsonaro. A PF demonstra com documentos que ele foi aos Estados Unidos recomprar um dos kits de joias desviados da Presidência, para ajudar Bolsonaro.
Ele nega ilegalidades, assim como os demais envolvidos no escândalo.
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