Caso Dorothy
Policial confirma arma e propina, e envolve delegado no crime
"Sobretudo nos trechos em que é citado o nome do delegado Marcelo Luz, acusado de entregar ao intermediário do crime, Amair Feijoli da Cunha, o “Tato”, a arma com a qual Rayfran das Neves Sales, o “Fogoió”, matou com seis tiros a missionária".
Arma que matou Dorothy pode ser de delegado
A possível
reabertura do caso que envolve o assassinato da missionária Dorothy
Stang, provocada pelo depoimento em cartório do policial federal
Fernando Luiz Raiol, caiu como uma bomba na Polícia Civil, no Ministério
Público e no Judiciário.
Os fatos novos revelados na edição de domingo
passado no jornal Diário já provocaram a primeira decisão, do delegado-geral da
Polícia civil, Nilton Athayde, de abrir inquérito para apurar as
declarações de Raiol, sobretudo nos trechos em que é citado o nome do
delegado Marcelo Luz, acusado de entregar ao intermediário do crime,
Amair Feijoli da Cunha, o “Tato”, a arma com a qual Rayfran das Neves
Sales, o “Fogoió”, matou com seis tiros a missionária.
Amair Cunha, o Tato, condenado a 18 anos pelo crime |
Nesse depoimento, Raiol apenas confirmou o
que Vitalmiro Moura, o “Bida”, condenado como suposto mandante, havia
declarado em março passado, à revista Época. Ainda segundo Raiol, também
seriam verdadeiras a acusação feita por “Bida” de que o delegado
receberia propina de fazendeiros de Anapu para proteger as terras deles
contra os agricultores ligados a Dorothy. As acusações, acrescidas da
suspeita da existência de um consórcio de pessoas poderosas da região de
Altamira interessadas na morte da missionária, na verdade, eram para
ter sido apuradas há sete anos, durante a investigação do assassinato.
Isso, no entanto, nunca aconteceu.
Uma Comissão Especial do Senado que esteve
em Anapu, semanas depois do crime, levantou informações sobre o
consórcio, sugerindo às autoridades do Pará que as investigações fossem
aprofundadas. Se isso tivesse ocorrido, outros acusados teriam sentado
no banco dos réus, além daqueles que foram denunciados pelo Ministério
Público. Relatório elaborado pelos senadores Ana Júlia Carepa, Eduardo
Suplicy, Sibá Machado, e Demóstenes Torres, que integraram a comissão,
aborda que, ainda no dia da prisão, em seu primeiro depoimento, perante o
delegado Uálame Machado, da Policia Federal, “Bida”, cujo nome até
então não havia sido citado entre os que ameaçavam Dorothy, prestou dois
depoimentos. No primeiro, negou ter prestado qualquer auxílio pessoal
ou material a Rayfran e Clodoaldo – cúmplice no assassinato e que
atualmente se encontra foragido - após o crime, além de negar ter sido o
mandante.
Taradão mandante |
No dia 27 de março de 2005, segundo o
relatório dos senadores, “mediante o compromisso das autoridades de que o
conteúdo de suas declarações não fossem levadas a público”, ele foi
novamente interrogado. Na presença de seus advogados, de representantes
do Ministério Público, da presidente da comissão, a então senadora Ana
Júlia Carepa, “Bida” citou os nomes de outras pessoas que estariam
também envolvidas no assassinato. “A nova versão, mantida em sigilo,
certamente propiciará às autoridades policiais, judiciais e do
Ministério Público fazer levantamentos que poderão alcançar mais pessoas
envolvidas no crime em questão e em outros praticados por ou a mando de
pistoleiros e grileiros da região”, afirma o relatório.
Em entrevista concedida a um jornal do Acre,
foi perguntado à missionária se ela estava recebendo ameaças de morte,
tendo respondido que sim. “Ameaça de morte não só a mim, mas também às
outras lideranças e a expulsão de posseiros das terras são frequentes,
conforme foi constatado pelo desembargador Gercino José da Silva,
ouvidor Agrário Nacional, na audiência pública, realizada no dia 26 de
setembro de 2003, em Anapu. Hoje sou ameaçada de morte, publicamente,
por fazendeiros e grileiros de terras públicas, como foi visto por todos
que presenciaram a Conferência Popular realizada em Altamira, onde
estava presente também o ministro do Desenvolvimento Agrário e tantas
outras autoridades”, dizia a missionária.
O fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida |
Para os senadores, a missionária Dorothy
Stang, de 73 anos, não tinha a intenção de “fazer revolução” em Anapu.
Há 30 anos na Amazônia, o seu trabalho era para assentar 600 famílias em
lotes de 100 hectares e implantar projetos de desenvolvimento
sustentável. Foram inúmeras as ameaças de morte contra ela, da mesma
forma que foram incontáveis os pedidos de proteção às autoridades por e
para integrantes do Ministério Público Estadual e Federal, da
magistratura do Pará e de representantes parlamentares.
Em 15 de junho de 2004, o procurador da
República Felício Pontes Júnior, encaminhou ofício ao secretário
Especial de Defesa Social do Estado do Pará, Manoel Santino Nascimento
Júnior, com cópia à Superintendência da Polícia Federal, pedindo
proteção à vida da missionária. Quatro meses antes de Dorothy ser
fuzilada, a juíza da Vara Agrária de Altamira, Danielle Bühnheim, pediu
via oficio à policia do Pará que fornecesse proteção a irmã. Alguns dias
antes de ser assassinada, houve o encontro com o ministro Nilmário
Miranda, a quem também foram relatadas as ameaças. O relatório dos
senadores ressalta que Dorothy jamais pediu ou aceitou integrar os
programas de proteção de vítimas e testemunhas ameaçadas (Provita),
reafirmando sempre que a proteção mais eficaz seria aquela que se
estendesse a toda a comunidade.
Entre as recomendações contidas nesse
relatório está a solicitação aos Ministérios Públicos para que
“continuem a acompanhar as investigações que estão sendo feitas em autos
suplementares que objetivam apurar os desdobramentos do assassinato e
possível existência de consórcio com vistas a patrocinar esse e outros
crimes praticados no Pará”. Agora, diante das declarações do agente da
PF, Fernando Luiz Raiol, a reabertura do caso para investigar o que foi
arquivado às pressas torna-se urgente e necessário.
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