"Segundo denuncia, a Juíza Ezilda
Mutran estaria envolvida no esquema de beneficiamento de processos eleitorais".
Uma gravação com onze minutos de
duração, contendo denúncia de pagamento de propina a
membros do Tribunal Regional Eleitoral (TRE) para obtenção de resultados
favoráveis em processo de cassação de mandato, provocou a entrada da Polícia
Federal no caso. A pedido do TRE, o Ministério Público Federal (MPF), que
recebeu uma cópia da gravação, requisitou à PF a abertura de inquérito para
apurar conversa na qual o ex-deputado e ex-prefeito de Marituba, Antônio
Armando Amaral de Castro, diz ao atual prefeito de Marabá, João Salame, que ele
deveria pagar R$ 150 mil à juíza Ezilda Mutran para obter decisão favorável no
processo julgado na última terça-feira e que resultou na cassação do mandato do
prefeito por 3 votos a 2. Salame foi acusado de compra de votos na eleição de
deputado, em 2010.
Diciomar teria pago 300 mil |
Em um CD, cuja cópia foi obtida pelo DIÁRIO, o conteúdo da conversa, que
além da suposta propina envolve a juíza e o prefeito em um antigo problema
familiar, chegou às mãos do presidente do TRE, desembargador Leonardo de
Noronha Tavares, por intermédio do advogado Inocêncio Mártires Coelho Júnior,
defensor de Salame no processo que tratava de
sua cassação. Na gravação, Antônio Armando conta uma série de vantagens,
afirmando inclusive ter sido ele o responsável pela salvação, no TRE, do
mandato do ex-prefeito de Belém, Duciomar Costa, que foi acusado de compra de
votos e abuso de poder econômico.
O ex-prefeito de Marituba – já condenado na justiça eleitoral por
diversas irregularidades -, conta que a juíza, para mudar seu voto no
julgamento de Duciomar, antes contrário à cassação e depois contra, teria tido
uma “inspiração divina”. Armando diz
quanto pagou no TRE para salvar o mandato de Duciomar e dá nomes de pessoas. No
auge da conversa, pediu a Salame R$ 150 mil para resolver o processo do
prefeito de Marabá no Tribunal, afirmando que o dinheiro s
eria entregue à
Ezilda Pastana.
Saleme não entrou no esquema proposto |
Salame procurou Inocêncio Mártires e o advogado o aconselhou a não
entrar no jogo, que era muito perigoso. E disse ao prefeito que a situação se
assemelhava ao vício em drogas, que tem porta de entrada, mas não a de saída. O
advogado aconselhou o prefeito a lutar pelo seu mandato no Tribunal.
Depois dessa conversa, o advogado informou ao prefeito que iria entregar
a gravação ao desembargador Leonardo Tavares. Isso ocorreu antes do julgamento
de Salame e antes também que Ezilda Pastana, relatora do processo, concluísse
seu voto, que depois todos vieram a saber, era favorável à cassação do mandato
do prefeito. Em uma conversa preliminar, antes da entrega da gravação,
Inocêncio contou a Tavares o que estava acontecendo, ouvindo do desembargador
que o assunto era “muito grave”.
Sigilo
Quando a juíza proferiu seu voto, já no julgamento do caso, Salame
estava na sessão do Tribunal e teria ficado aborrecido. Momentos depois, em
companhia de Inocêncio, ele foi ao gabinete de Tavares e lá disse ao presidente
do TRE que o voto de Ezilda o teria deixado “enojado”, para em seguida
acrescentar que estava pensando em abandonar a política. Depois, em conversa
reservada, Inocêncio disse a Tavares que o prefeito estava revoltado com o que
acontecera na sessão do TRE. “O presidente ficou preocupado e me disse que gostaria
de ter acesso à gravação e eu a entreguei”, contou ao Diário.
O desembargador Leonardo Tavares informou por sua assessoria que não irá
se manifestar sobre o caso, que está “sob sigilo” de investigação. A mesma
postura foi adotada pelo MPF. A procuradora Melina Alves Tostes, designada pelo
órgão, é quem vai atuar no ca
Antonio Armando, emissário da corrupção |
so. A juíza Ezilda Pastana, procurada para
comentar o envolvimento de seu nome na gravação, não quais falar com o DIÁRIO,
apesar das ponderações de um advogado que com ela manteve contato.
Prefeito acusa juíza de “ódio e rancor”
O prefeito João Salame, que está em Brasília, entrando com recurso no
Tribunal Superior Eleitoral (TSE) contra a decisão do TRE se manter no cargo,
declarou ao DIÁRIO, por meio de nota, que fez a gravação, no carro de Antônio
Armando, para se proteger num processo que avalia como “nebuloso e cheio de
interferências políticas e pessoais que fogem da esfera jurídica”. Segundo
Salame, a entrega do áudio a Inocêncio Júnior para que ele o encaminhasse ao
presidente do TRE foi para cumprir seu “papel de cidadão”, acrescentando ter
sido vítima de um julgamento “contaminado por questões de natureza pessoal,
tendo em vista que a juíza Izilda Pastana Mutran, relatora do processo, foi
denunciada na polícia, 20 anos atrás, por ter agredido fisicamente a atual
esposa dele, à época grávida de oito meses.
Salame relata que, lamentavelmente, o registro dessa denúncia contra a
juíza, “desapareceu misteriosamente dos registros da delegacia, o que nos
impediu de solicitar sua suspeição”. Ele também lamenta que o desembargador
Leonardo Tavares tenha recebido a gravação de áudio logo no começo da
apreciação de seu processo no Tribunal e não tenha optado por suspender o
julgamento para apurar, no âmbito da sua competência, a falta de isenção
manifesta da relatora do caso. E ataca: “não aceitei pagar propina que me foi
exigida para ser inocentado de algo que não fiz. Minha biografia não admite o
emprego deste tipo de artifício”
Mais adiante, o prefeito afirma ter sido “condenado injustamente” por
uma julgadora que demonstrou possuir “ódio e rancor” por fato do passado.
Observa que para ser condenado a verdade foi varrida e que toda a sociedade de
Marabá é testemunha de que, na véspera do pleito de 2010, fez carreata pela
cidade. Até seus adversários políticos confirmam isso. Só a juíza não teria se
curvado às evidências e classifica isso de “trapaça ética”. Chama de ruidosa
operação da Polícia Federal no posto de gasolina em Marabá ocorrida em 2010,
quando apreendeu 18 notas de abastecimento, totalizando 200 litros de
combustível, volume que define como “compatível com a realização do evento
eleitoral”, e cujos gastos foram incluídos em sua prestação de contas aprovada
pela Justiça Eleitoral.
Provas
Ao concluir, o prefeito informa que já se colocou à disposição do
Ministério Público Federal para esclarecer os fatos narrados na gravação e
acrescentar “outros elementos que vão robustecer as provas de que há algo mais
entre o céu e a terra no TRE do Pará do que nossa vã filosofia possa imaginar”.
E diz que será “incansável” na busca da Justiça. “O mandato de prefeito de
Marabá me foi confiado por 57% dos votos dos eleitores de Marabá e o Tribunal
Superior Eleitoral já decidiu que não é juridicamente possível cassar mandato
conquistado na eleição de 2012 por alegada infração supostamente cometida no
pleito de 2010.”
A GRAVAÇÃO:
1- A gravação revela conversa entre Antônio Armando e João Salame,
quando Armando fala que salvou o mandato de Duciomar Costa, então prefeito de
Belém, quando ele esteve à beira da cassação no TRE, pagando propina de R$ 300
mil para a juíza.
2- Antônio Armando pede R$ 150 mil ao prefeito de Marabá, para também
ajudá-lo a não ser cassado pelo Tribunal, dizendo que o dinheiro seria entregue
à juíza Ezilda Pastana.
3- João Salame leva a proposta de Armando ao seu advogado Inocêncio
Mártires Júnior, que o aconselha a não entrar no jogo e o incentiva a lutar
pelo mandato.