quinta-feira, 5 de setembro de 2019

Justiça designa audiência sobre pedido do MPF para apuração de denúncias de tortura em presídio no Pará

Fotos publicadas pelo MPF na ação judicial
União e Estado serão intimados. Ação também pediu tratamento de saúde prioritário aos feridos e livre acesso de integrantes da OAB e do Conselho Penitenciário ao local
A Justiça Federal determinou nesta quarta-feira (04) que a União e o Estado do Pará serão intimados a participar de audiência judicial para tratar da possibilidade de conciliação com o Ministério Público Federal (MPF) em processo em que o MPF pede a determinação de que sejam apuradas e coibidas ilegalidades no complexo penitenciário de Americano, no município de Santa Izabel (PA), na região metropolitana Belém. A audiência está marcada para a próxima terça-feira (10/09), na sede da Justiça Federal na capital paraense.
Na ação, ajuizada no último dia 30, o MPF pede que os relatos sejam apurados com base na aplicação do Protocolo de Istambul e do Protocolo Brasileiro de Perícia Forense. Produzido no âmbito da Organização das Nações Unidas (ONU) e ratificado pelo Brasil, o Protocolo de Istambul é um manual para a investigação e documentação eficaz da tortura e outras penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes.
O MPF também pede que a União e o Estado do Pará sejam obrigados a providenciar, de forma urgente, tratamento de saúde (médico – inclusive psiquiátrico –, farmacêutico, odontológico e psicológico) aos detentos, com prioridade para os que relatam ou se evidencia ferimentos e machucados, e nos doentes.
Foi pedido na ação, ainda, que a Justiça obrigue a União e o Estado do Pará a permitir a advogados, a membros da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) no exercício da fiscalização do sistema prisional e a integrantes do Conselho Penitenciário do Estado do Pará (Copen) livre acesso, livre trânsito e entrevista pessoal e reservada com presos do complexo de Americano, sem oitiva por agentes públicos, independente de autorização, permissão, licença, procuração, prévio agendamento ou qualquer outro obstáculo criado por agentes públicos, ainda que considerados presos incomunicáveis.
Outro pedido do MPF à Justiça Federal foi que, após oitiva da União e do Estado do Pará, esses entes estatais sejam obrigados a permitir visita aos presos de familiares ou outras pessoas autorizadas, exceto se a União e o Estado do Pará comprovarem de modo específico, concreto e documental (fotos, vídeos, relatórios), que permanece estado de excepcionalidade, como, por exemplo, que tais visitas representam ameaça à vida e à integridade física de presos, familiares e agentes públicos, independente do prazo formal de permanência da Força-Tarefa de Intervenção Penitenciária (FTIP) no complexo penitenciário.
As denúncias – Desde o início de agosto, quando a FTIP passou a atuar no presídio, o MPF vem recebendo denúncias de mães, companheiras de presos, presos soltos recentemente, membros do Conselho Penitenciário e membros da OAB que fiscalizam o sistema penitenciário. Os relatos narram uma série de violações a normas nacionais e internacionais no tratamento dos presos.
Entre elas, denúncias de que os presos vêm sofrendo violência física pelos agentes federais, pois estão apanhando e sendo atingidos por balas de borracha e spray de pimenta, de modo constante, frequente e injustificado, mesmo após muitos dias da intervenção, e sem que tenha ocorrido indisciplina dos presos.
Os presos, registram os denunciantes, também vêm sofrendo violências morais pelos agentes federais, como ameaças, intimidações, humilhações, demonstrações excessivas de poder e controle (como ordem dos agentes federais para ficarem imóveis e em silêncio absoluto, pelo que, por impossível, apanham), de modo constante, frequente e injustificado, mesmo após muitos dias da intervenção, e também sem prévia indisciplina dos presos.
Também há declarações de que os detentos não estariam sendo alimentados (veem comida chegando, mas não é distribuída, dizem os denunciantes), ou que são alimentados em quantidade e qualidade aquém da mínima essencial, sem qualquer diferenciação da alimentação para diabético, hipertensos e doentes, além de sofrerem privação de água, apontam as denúncias.
Há relatos, ainda, de falta de assistência à saúde, mesmo no caso de presos feridos com balas de borracha, ou lesionados por causa da violência física dos agentes federais, com privação de medicação e tratamento, inclusive nos casos de pessoas com deficiência, HIV e tuberculose.
Informações enviadas ao MPF também apontam que os condenados estão em locais sem condições mínimas de salubridade e higiene, com ratos, superlotação em nível de desmaio e sufocamento, dormindo no chão.
Os detentos foram privados ou recebem quantidade insuficiente de materiais de higiene pessoal, são obrigados a ficar nus ou somente de cueca, descalços, molhados, e alguns não podendo sair do lugar sob pena de violência, sujos pelas necessidades fisiológicas, citam os denunciantes.
Também há relatos de que os presos estão incomunicáveis, sem acesso não somente à visita de familiares, mas também de advogados, membros da OAB no exercício da fiscalização do sistema penitenciário, e de integrantes do Conselho Penitenciário.
Processo nº 1004528-68.2019.4.01.3900 – 5ª Vara da Justiça Federal em Belém (PA)

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