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Pista da empresa Piquiatuba em Santarém |
BRASÍLIA(O Globo) - Fundada por um empresário acusado de ser dono de garimpos ilegais no Pará, a Piquiatuba Táxi Aéreo assinou contratos com o governo federal que, somados, chegam a R$ 16,1 milhões. Um deles foi firmado com a Funai para levar agentes e produtos como remédios a territórios indígenas. Mas, segundo o Ministério Público Federal, aviões da empresa também foram usados para transportar garimpeiros e alimentos a áreas de exploração ilegal na Amazônia.
A Funai contratou os serviços da Piquiatuba em julho do ano passado, por R$ 500 mil. Antes, a partir de 2019, a Secretaria Especial de Saúde Indígena firmou seis contratos com a mesma empresa, cinco com dispensa de licitação, justificada pela pandemia de Covid-19. O maior deles, de R$ 8,6 milhões, foi para atender aos ianomâmis, em Roraima, uma das etnias mais ameaçadas pelo garimpo ilegal.
Operação em 2020
O acordo com a Funai prevê o uso por até 100 horas de dois aviões para atender às demandas da Coordenação da Frente de Proteção Etnoambiental Cuminapanema, no norte do Pará. A frente é responsável por fiscalizar a mesma área onde fica o garimpo do Limão, cujo ouro, segundo o Ministério Público Federal, foi explorado ilegalmente pelo fundador da Piquiatuba, o empresário Armando Amâncio da Silva [ já falecido]. Uma investigação apontou que aviões da empresa fizeram pelo menos 182 voos entre 2015 e 2018 à região.
Amâncio morreu em 2020 de câncer, dias depois de uma operação da Polícia Federal ter apreendido 44 quilos em barras de ouro em um cofre em sua casa, em Santarém. O ouro foi avaliado em quase R$ 15 milhões. De acordo com a PF, foi retirado da Reserva Biológica Maicuru.
As investigações apontaram que foi desta terra indígena no Pará que Amâncio extraiu a fortuna que o levou a se tornar empresário de aviação. Os filhos do empresário comandam a Piquiatuba atualmente.
O advogado Paulo Emílio Catta Preta, que defende os donos da empresa, nega que a Piquiatuba preste serviços a garimpeiros e reforçou que os aviões são utilizados exclusivamente para o transporte de pacientes e de servidores da Funai. Mas em uma investigação aberta pela própria fundação, em conjunto com o Exército, indígenas disseram ter reconhecido um aparelho da empresa de táxi aéreo como o mesmo que foi usado por garimpeiros em atividade nas regiões dos rios Mucajaí e Couto Magalhães, que atravessam o território ianomâmi em Roraima.
Sem pesquisa de sócios
Segundo relatório do caso, ao qual o GLOBO teve acesso, em agosto de 2019 um avião da Piquiatuba aterrissou na aldeia Sikamabiú, enquanto militares interrogavam mulheres da comunidade sobre o garimpo ilegal. “Pousou hoje, por volta de 10:00h um avião do tipo PT contratado da SESAI, para trazer e levar pessoal e material. Nos foi informado que esta empresa de transporte aéreo é nova (foi contratada recentemente) e a comunidade indígena de Sikamabiú afirma que esta mesma empresa faz transporte logístico para os garimpos da região. A aeronave foi identificada com o prefixo: PR-BAP, de cores branca e azul. O nome da empresa é Piquiatuba”, diz o relatório.
O Ministério da Justiça, pasta a qual a Funai é vinculada, afirmou que, antes da contratação da Piquiatuba, “foram consultadas todas as certidões públicas vinculadas à empresa”. Mas as buscas não incluíram pesquisa sobre os sócios, “o que inviabiliza a informação a respeito da investigação dos empresários”.
“Não compete ao órgão a realização de investigações criminais de empresários supostamente vinculados às empresas contratadas pela Administração Pública”, informou o ministério.
Com 17 aviões e lucro de R$ 1,2 milhão, a Piquiatuba transportou de março de 2019 a fevereiro deste ano insumos, servidores, pacientes e cargas perigosas a comunidades indígenas de Roraima, Amazonas e Amapá. O Ministério da Saúde informou que, no momento da assinatura do contrato, a Piquiatuba “cumpria todos os requisitos legais”.