Em números de trabalhadores escravizados, o Pará fica na terceira posição, com 116 pessoas flagradas sendo submetidas a condições semelhantes às de escravidão. Minas Gerais registra 1008 casos, e o Paraná tem a segunda posição, com 156 escravizados.
A lista suja é uma relação de empreendimentos em que houve flagrante de trabalho escravo e cujos responsáveis foram condenados administrativamente por decisão contra a qual não cabe recurso. Caso os infratores paguem as multas devidas e não voltem a praticar o crime, o nome do estabelecimento pode deixar a lista suja após dois anos.
O documento tem sido utilizado, por exemplo, como apoio para empresas no momento da decisão de contratar ou não fornecedores citados na relação de infratores.
Confirmações – “O fato de o Pará aparecer entre os primeiros colocados em um ranking de trabalho escravo confirma o quanto o problema é persistente no estado. Lamentavelmente, estamos entre os campeões desde que as fiscalizações começaram. De 1995 pra cá, já foram resgatados mais de 50 mil trabalhadores no país, e pelo menos um quarto desse total estava no Pará”, critica o procurador-chefe do Ministério Público Federal (MPF) no Pará, Alan Mansur.
Segundo ele, esses dados também confirmam o quanto prejudicial pode ser a alteração do conceito de trabalho escravo, proposta na semana passada pela portaria 1.129, do Ministério do Trabalho (MTb). A nova regra reduz os elementos que indicam o trabalho escravo, de forma que a jornada excessiva ou a condição degradante só poderão ser comprovadas quando for constatada a restrição de liberdade do trabalhador, eliminando os outros elementos dispostos na legislação.
“Se, com as leis que tem, o Brasil não conseguiu eliminar o crime, não é afrouxando essas regras que o país terá sucesso”, comenta o membro do MPF. “O poder público tem que fazer o caminho oposto: buscar intensificar a fiscalização e a punição”.
Também na semana passada o MPF e o Ministério Público do Trabalho (MPT) recomendaram ao ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira, a revogação imediata da portaria. Para o MPF e o MPT, a portaria é ilegal por contrariar o artigo 149 do Código Penal, que define como caracterização de condição análoga à de escravo a submissão a trabalhos forçados, jornada exaustiva, condições degradantes de trabalho e restrição da liberdade do trabalhador.
Outro ponto preocupante previsto na norma é a eliminação da servidão por dívida, também prevista no Código Penal. A partir da publicação, a empresa só poderá ser autuada pelo crime quando houver uso de coação, cerceamento do uso de meios de transporte, isolamento geográfico, segurança armada para reter o trabalhador e confisco de documentos pessoais. Segundo os membros do Ministério Público que assinam a recomendação conjunta, a nova portaria dificulta a persecução penal de empresas que cometem o crime e representa um grave retrocesso no combate ao trabalho escravo.
Burocratização – As mudanças na confecção do relatório de fiscalização do MTb e a responsabilidade de inclusão de empresas na lista suja do trabalho escravo também são alvo de preocupação dos Ministérios Públicos Federal e do Trabalho.
Isso porque a inclusão e divulgação da lista de empresas flagradas infringindo a lei, antes feita por técnicos do MTb, passa a ser atribuição exclusiva do ministro do Trabalho. A inclusão da empresa na lista suja implicava a permanência de um ano no cadastro, bem como o pagamento de débitos trabalhistas e indenizações ao trabalhador. Com a portaria, as obrigações do empregador são extintas.
A recomendação também critica a burocratização do relatório para autuação da empresa. Antes, o documento consistia em um relato das condições irregulares encontradas durante as fiscalizações. Pelas novas regras, o documento deve conter um boletim de ocorrência lavrado por policial que tenha participado do flagrante. A equipe técnica do MTb também deverá enviar ofício à Polícia Federal com fotos de todas as irregularidades.
A recomendação é assinada pela procuradora da República Ana Carolina Roman, representante do MPF na Comissão Nacional para Erradicação do Trabalho Escravo (Conatrae); pelo procurador do Trabalho Thiago Muniz Cavalcanti, representante do MPT na Conatrae; pela coordenadora da Câmara Criminal do Ministério Público Federal, subprocuradora-geral da República Luiza Frischeisen; e pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat.
O documento foi entregue em mãos pela procuradora-geral da República, Raquel Dodge, ao ministro do Trabalho. MPF
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