Três inquéritos sigilosos do Superior Tribunal de Justiça miram a gestão do governador do Pará no combate à Covid-19. Material está com a CPI da Pandemia.
Três inquéritos sigilosos do Superior Tribunal de Justiça (STJ) miram a gestão do governador do Pará, Helder Barbalho (MDB), suspeito de participar de um esquema criminoso instalado na administração pública para fraudar licitações e desviar recursos públicos da área de saúde. As apurações revelaram que Helder discutia com empresários assuntos relacionados a compras que seriam efetuadas depois pelo Estado. Um dos processos se debruça sobre contratos feitos entre o governo paraense e organizações sociais para a gestão de hospitais de campanha em Belém e municípios do interior. Os valores firmados ultrapassam a cifra de 1,2 bilhão de reais.
Esses contratos dos hospitais de campanha seriam loteados, direcionados, fraudados e superfaturados, segundo os investigadores. O Ministério Público Federal (MPF) encontrou indícios de organização criminosa, fraude à licitação, corrupção e lavagem de dinheiro em um esquema ilegal envolvendo empresários e pelo menos quatro secretarias estaduais, por meio da participação de agentes públicos. O material, de cerca de 280 mil páginas, foi compartilhado com a CPI da Pandemia.
Entre as irregularidades apontadas na gestão de hospitais estão sobrepreço de itens, ausência de parecer jurídico sobre os contratos, indícios de que propostas apresentadas por organizações diferentes eram idênticas e até mesmo subcontratação de serviços médicos por parte dessas entidades. “O descaso com a gestão do sistema de saúde fica evidente nas divulgações que relatam a precariedade das unidades de saúde e dos serviços prestados, a despeito dos repasses milionários de recursos públicos aqui expostos”, apontou o relator do caso no STJ, ministro Francisco Falcão.
Os procuradores também investigam compras efetuadas pelo governo do Pará, como a aquisição de 400 respiradores e 1,6 mil bombas de infusão. Barbalho participou diretamente das tratativas, trocando mensagens com o empresário André Felipe Silva, que atuou como representante comercial da empresa de importação SKN. De acordo com a Procuradoria-Geral da República (PGR), o negócio é fruto de relações pessoais.
“Qualquer produto hospitalar que vc precisar me envia as especificações durante o dia, que na madrugada meu pessoal levanta nos fornecedores na China, que forneceram para epidemia de lá”, escreveu André Felipe para Helder, em março de 2020. “E as bombas de infusão tmb estão neste preço? (envia um arquivo em anexo)”, respondeu Helder. “Se vc quiser algo específico me passa a especificação”, afirmou o empresário. “Monitor multi paramétrico, oxímetro de pulso, bomba de infusão”, elencou o governador do Pará. Ao ser indagado sobre a quantidade necessária, Helder responde: “de 300 até 600”.
Em outra conversa com André Felipe, em abril de 2020, ou seja, um mês depois, Helder demonstra irritação com a demora na entrega de respiradores. “Só dia 3?. Você está brincando comigo. Se for dia 3 isto é molecagem. Estou me f….. aqui por que vcs não entregaram dia 15. Minha paciência acabou. Vc está ganhando uma fortuna”, escreveu o governador.
Quando os respiradores finalmente chegaram, o emedebista fez questão de posar para fotos ao receber os aparelhos no aeroporto, mas uma série de falhas técnicas que inviabilizaram o uso. Apesar das conversas no WhatsApp, as filiais da SKN não possuíam à época do acordo autorização de funcionamento pela Anvisa, o que seria imprescindível para a fabricação, distribuição e importação de bombas de infusão. “Os supostos fatos ilícitos investigados são especialmente graves, uma vez que praticados em estado de calamidade pública, em período de crises sanitária, econômica e social ocasionadas pela pandemia”, observou a subprocuradora-geral da República Lindôra Maria Araújo.
Procurado pela reportagem, Helder afirmou que a denúncia de que os respiradores vindos da China não funcionavam para tratamento de Covid-19 foi do próprio governo do Pará, “que conseguiu a devolução de todo o recurso utilizado como adiantamento”. “Não houve prejuízo aos cofres públicos. O Estado processa a empresa importadora por danos morais coletivos”, afirmou.
Sobre os hospitais de campanha, o governador alegou que os preços pagos “estão abaixo da média de mercado e abaixo, inclusive, da própria tabela de referência do Ministério da Saúde”. “No Pará as organizações sociais atendem há muito anos. Nesta pandemia, o governo teve que agir praticamente sozinho, quando hospitais municipais e até privados fecharam as portas à população. Neste esforço, salvamos mais de 200 mil vidas”, acrescentou.
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