quinta-feira, 10 de janeiro de 2013

"É muito barato matar um jornalista hoje no mundo", diz líder de entidade.

Ele cobra ações dos governos para frear as mortes e acusa as Nações Unidas de não tomarem medidas práticas que ajudem a reforçar a segurança dos profissionais que cobrem conflitos.

Por BERNARDO MELLO FRANCO
DE LONDRES 

Jim Boumelha, presidente da Federação Internacional dos JornalistasOs assassinatos por encomenda se tornaram uma ameaça maior à vida de jornalistas do que as guerras.
O alerta é de Jim Boumelha, presidente da Federação Internacional dos Jornalistas (IFJ, na sigla em inglês).
Ele cobra ações dos governos para frear as mortes e acusa as Nações Unidas de não tomarem medidas práticas que ajudem a reforçar a segurança dos profissionais que cobrem conflitos.
Um relatório divulgado pela IFJ no último dia 31 informa que 121 jornalistas foram assassinados em 2012 no exercício da profissão ou em represália por seu trabalho.
O ranking de mortes é liderado por Síria (35 casos) e Somália (18), que vivem conflitos armados.
O Brasil aparece em quinto lugar, com seis mortes --Eduardo Carvalho, do "Última Hora News" (MS); Valério Luiz, da rádio Jornal 820 (GO); o blogueiro Décio Sá (MA); Paulo Roberto Cardoso Rodrigues, do "Jornal da Praça" (MS); Mário Randolfo Marques Lopes, do "Vassouras na Net" (RJ); e Laécio de Souza, da Sucesso FM (BA).
Está à frente de países que passaram por guerras como Iraque e Afeganistão.


Jim Boumelha, presidente da Federação Internacional dos Jornalistas
VEJA A ENTREVISTA COMPLETA:
Folha - O relatório da IFJ mostra que 2012 foi um dos anos mais sangrentos para a imprensa, com 121 jornalistas assassinados. O que esse número representa?
Jim Boumelha - É um número terrível, precisamos chamar atenção para ele. Se fossem cem médicos ou cem advogados assassinados em um ano, não se falaria em outra coisa no mundo.
O mais preocupante é que a soma de mortes tem se mantido num patamar muito alto a cada ano que passa.
Os países em guerra civil lideram o ranking de mortes de jornalistas, mas não chegam à metade do total de casos no mundo. Por quê?
As pessoas acham que a maioria das mortes acontece nas coberturas de guerra, mas isso não é verdade.
A maior parte dos assassinatos que nós temos registrado é fruto de perseguição a profissionais que estão fazendo reportagens nos lugares em que costumam trabalhar no seu dia a dia.
É muito barato matar um jornalista. A impunidade é muito grande.
Em vários países, esta tem sido a melhor forma de silenciar um jornal ou interromper uma série de reportagens investigativas.
Na maior parte das vezes, os alvos desses assassinatos por encomenda são jornalistas que não são famosos. Por isso, os crimes acontecem e muita gente nem se lembra dos nomes das vítimas.
É o caso do Brasil, onde os seis mortos em 2012 trabalhavam para sites ou veículos de expressão regional...

Exatamente. E seis assassinatos é um número muito alto para um só país. O Brasil é um caso preocupante.

As famílias dessas vítimas deveriam se unir para forçar o governo a fazer alguma coisa. Não há nada mais forte para pressionar políticos do que as vozes de viúvas e órfãos.
Outro caso que chama a atenção é o do México, que teve dez jornalistas assassinados em 2012. O país está vivendo uma guerra por causa das drogas, e os repórteres que investigam isso estão se tornando alvos do tráfico.
Entre tantas notícias ruins, o relatório traz algum avanço que mereça ser destacado?
Sim. A Rússia, que era um dos países mais perigosos, só registrou duas mortes em todo o ano. Isso reflete um esforço dos órgãos de investigação e da sociedade para combater a impunidade.
Nas coberturas de guerra, é possível fazer alguma coisa para reforçar a segurança dos correspondentes?
Quando você está no fogo cruzado, é impossível eliminar os riscos. Tudo o que se pode fazer é reduzi-los.
Nos últimos anos, as grandes empresas de mídia sofreram muita pressão em seus países e tiveram que tomar medidas para proteger e treinar melhor os seus enviados especiais a zonas de conflito.
O maior problema está entre os jornalistas que cobrem guerras para grupos menores ou como freelancers [sem contrato fixo de trabalho].
Também temos uma preocupação muito grande com as pessoas que atuam nessas regiões como fixers [ajudantes das equipes] ou como intérpretes.
Muitas vezes, são as que mais se arriscam para viabilizar uma reportagem.
Há algo que possa ser feito para frear as mortes na Síria?
Infelizmente, não existe uma fórmula mágica. Tem sido difícil até contabilizar as mortes, porque muitas informações chegam de forma truncada ou contraditória.
Muitas pessoas estão cobrindo o conflito como blogueiros ou nas redes sociais.
O comunicado que foi divulgado junto com o relatório da IFJ acusa a Organização das Nações Unidas de se omitir sobre as mortes de jornalistas em áreas de conflito. Por quê?
As posições da ONU são muito boas no papel.
O Conselho de Segurança já manifestou preocupação com o assunto, chegou a editar uma resolução para frear as mortes, mas nada aconteceu.
Desde que essa resolução foi aprovada, em 2006, já morreram mais de 600 jornalistas.
O fato é que os assassinatos continuam ocorrendo e a ONU não tem feito pressão política sobre os países para reverter o quadro.
Assim que um ano termina, como agora, nós fechamos o relatório de mortes e já temos que começar a contar os novos casos do ano seguinte. O ciclo de violência não termina, permanece constante. 

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