O pior IDH
do país é da cidade de Melgaço, que fica na Ilha do Marajó, no Pará. Não
é preciso utilizar nenhum tipo de metodologia para saber quais
municípios apresentam os piores resultados do Índice de Desenvolvimento
Humano Municipal, o IDHM, divulgado ontem pelo Programa das Nações
Unidas para o Desenvolvimento (Pnud).
Basta caminhar pelas ruas das cidades do
Marajó e perceber que qualidade de vida é um termo que passa longe da
realidade dos moradores. Prova disso é que, dos 16 municípios da ilha,
oito estão entre os 50 piores IDHs do Brasil.
O IDH mede o nível de desenvolvimento humano
de determinada região com base nos dados do Censo Demográfico do
Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE). Utiliza como
critérios indicadores de educação (alfabetização e taxa de matrícula),
longevidade (esperança de vida ao nascer) e renda (PIB per capita).
O índice varia de zero (nenhum
desenvolvimento humano) a um (desenvolvimento humano total). Países com
IDH até 0,499 têm desenvolvimento humano considerado baixo, os países
com índices entre 0,500 e 0,799 são considerados de médio
desenvolvimento humano e países com IDH superior a 0,800 têm
desenvolvimento humano considerado alto.
Abaixo de 0,499 são considerados Muito
Baixos. O Pará tem 8 municípios nessa faixa. Os baixos somam 88. Os
médios são 44 e os que alcançaram índices de desenvolvimento humano
classificados como Alto foram três:
Ananindeua, Belém e Parauapebas.
Nestes três municípios o que destaca é o
indicador Longevidade, que é a esperança de vida ao nascer. Esse
indicador mostra o número médio de anos que uma pessoa nascida naquela
localidade no ano de referência deve viver. O indicador de longevidade
sintetiza as condições de saúde e salubridade do local, uma vez que
quanto mais mortes houver nas faixas etárias mais precoces, menor será a
expectativa de vida. É neste indicador que está apontada a redução da
mortalidade infantil, ou seja, quanto mais alto o indicador, menor a
mortalidade. Os indicadores de Renda e Educação também refletem bom
desempenho nos três melhores municípios do Pará.
Nos demais 140 dos 143 municípios (na época
do censo não havia o 144º) o índice pior avaliado e que contribuiu para
reduzir a médio foi o indicador Educação.
O estudo divulgado ontem faz parte do
trabalho “Atlas do Desenvolvimento Humano no Brasil 2013”, elaborado
pelo Pnud, que realiza este levantamento no Brasil pela terceira vez. Os
primeiros foram divulgados em 1998 e 2003. Os dados deste ano foram
feitos com base no Censo 2010.
Além de Melgaço, os piores resultados do
Marajó foram: Chaves (453), Bagre (471), Portel (483), Anajás (484),
Afuá (489), Curralinho (502) e Breves (503). Estes estão na lista dos 50
piores resultados por municípios do Brasil.
Mas fazem parte desta lista outros cinco
municípios do Pará: Cachoeira do Piriá (473), Ipixuna do Pará (489),
Nova Esperança do Piriá (502), Porto de Moz (503) e Jacareacanga (505).
O que esses municípios desta lista dos
piores têm em comum é o baixo desempenho histórico na educação. No
último Censo , todos apresentaram melhorias nos fluxos escolares por
faixa etária, principalmente nos anos finais do ensino fundamental, como
é o caso de Bagre. Mesmo assim, o peso de gerações mais antigas e de
menos escolaridade continua sendo um grande obstáculo a ser ultrapassado
e pesa quando se mede a base da educação de um município.
Outro aspecto que pode se observar em todos
os municípios é a queda da mortalidade infantil. Todos registraram
perceptível melhora nos números, mas ainda não o suficiente para
chegarem aos padrões aceitos mundialmente.
A baixa renda da população nesses municípios
paraenses que ficaram entre os 50 piores do Brasil também influenciou
na composição do índice. A dimensão renda por regiões e faixas de
desenvolvimento humano na região Norte continua sendo um dos mais graves
problemas a ser enfrentado por qualquer governante.
Para se ter uma ideia, o Atlas 2013 revelou
que 90% dos municípios do Norte do Brasil estão na categoria de Baixo e
Médio IDH. Apenas quatro municípios entre 449 tem IDHM Renda acima da
média do Brasil.
Marajó está abandonado pelo Estado
O baixo índice de Desenvolvimento Humano dos
municípios do Marajó não chegou a surpreender. Há anos, a região,
famosa pela riqueza da biodiversidade e pela belíssima paisagem, ocupa
postos vergonhosos quando o assunto são os indicadores da qualidade de
vida. “Esses dados refletem a carência total de políticas públicas para a
região”, afirma o economista e professor da UFPA, Eduardo Costa.
O destaque negativo desta vez ficou com
Melgaço, que teve o pior IDHM do Brasil. Apenas 0,418 em um índice que
vai de zero a um. De um modo geral, o Pará fez feio no ranking do IDHM,
em especial no que diz respeito à educação. Entre os 52 piores
indicadores nesse quesito, 12 são do Estado e desses, sete ficam no
arquipélago.
O economista destaca que desde 2008 está em
discussão o Plano de Desenvolvimento do Marajó, mas as ações que
poderiam mudar os indicadores da região não saíram do papel. “Para
desenvolver o Marajó seriam necessários esforços dos três entes
federados: União, Estado e municípios”, diz, afirmando que o principal
alvo desse esforço deveriam ser os investimentos em educação.
Em Melgaço, os dados são assustadores.
Metade da população de 24 mil habitantes não foi alfabetizada. No ensino
médio, havia apenas 681 matriculados em 2010 quando os dados foram
levantados. “É uma população que não tem projeto, expectativa de
empregabilidade”.
SEM PROJETOS
Para o presidente da Federação das
Associações dos Municípios Paraenses (Famep), Hélder Barbalho os números
reforçam que há um equívoco no atual modelo de desenvolvimento
econômico e social do Estado que tem promovido a concentração de renda e
deixado regiões à margem. “Não existem projetos de desenvolvimento
local”, diz. A Famep reúne prefeitos dos 144 municípios do Estado.
Recentemente, Helder participou de encontro
com as ministras do Planejamento, Orçamento e Gestão, Miriam Belchior; e
das Relações Institucionais, Ideli Salvatti e mais uma vez pediu que o
plano para o Marajó fosse implantado. “Apenas alguns itens do plano
foram contemplados, mas ainda existem muitas ações aguardando
atendimento”, diz o presidente da entidade, para quem deveria ser criada
uma Secretaria Estadual Extraordinária do Marajó para reunir todas as
políticas voltadas para a região. “Os desiguais precisam ser tratados de
forma diferenciada, com uma estratégia clara de melhorar a qualidade de
vida no Marajó. Até quando o poder público ficará adiando uma solução
sem apresentar resultados?”, indaga.
Sem recursos, municípios vivem círculo da exclusão
Também professor da Universidade Federal do
Pará, Agenor Sarraf é de Melgaço e foi secretário de Educação do
município. Ele diz que a falta de recursos condena o município a um
círculo vicioso. “Não estou querendo isentar o poder público, mas há uma
realidade difícil. Há baixa densidade demográfica e mais de 85% da
população está no espaço rural. Então, seria necessária uma estrutura de
barcos para reunir as crianças em uma escola e faltam recursos para
barcos e combustível. Com isso, muitos chegam à adolescência e à idade
adulta sem frequentar a sala de aula. As pessoas começam a trabalhar
cedo, não conseguem estudar. O poder público precisa fazer frente a essa
realidade”.
Em nota enviada à redação, a Secretaria de
Educação do Estado (Seduc), responsável pelo ensino médio, informou que
ampliará o número de vagas com a construção de uma nova escola. Hoje o
número de alunos matriculados chega a 951 estudantes.
Também seriam oferecidas 101 vagas em quatro
localidades mais distantes por meio do Sistema Organizado Modular de
Ensino (Some). O município com metade da população que não sabe ler nem
escrever aderiu ao Programa Nacional de Alfabetização na Idade Certa
(Pnaic), coordenado pela Rede Estadual de Ensino, executado pela
Universidade Federal do Pará (UFPA).
O prefeito do Melgaço, Adiel Moura de Souza,
e o secretário de Educação, Onilson Nascimento, foram procurados, mas
na tarde de ontem ninguém atendeu os telefones na sede da prefeitura e
na secretaria.
Pará tem piores índices em educação e renda
Segundo o levantamento, de acordo com as
faixas de desenvolvimento humano municipal adotadas pelo Atlas 2013, o
Brasil, atualmente com Alto Desenvolvimento Humano, melhorou sua
classificação em relação às edições anteriores. Em 2000, registrava
Médio Desenvolvimento Humano e, em 1991, Muito Baixo Desenvolvimento
Humano.
Cerca de 74% dos municípios brasileiros se
encontra nas faixas de Médio e Alto Desenvolvimento. O restante, 25%,
está entre aqueles que apresentaram Baixo ou Muito Baixo Desenvolvimento
Humano, um total de 1.431. A região Nordeste ainda é a que concentra o
maior número de municípios no grupo de Baixo Desenvolvimento Humano
(61,3%). No Norte do país, estes somam 40,1%.
Entre as que registram o maior número de
municípios na Faixa de Alto Desenvolvimento Humano estão as regiões Sul
(64,7%) e Sudeste (52,2%). O Centro-Oeste e o Norte aparecem como as
regiões com maior número de municípios classificados com Médio
Desenvolvimento Humano. Registraram, respectivamente, 56,9% e 50,3%
nesta categoria.
EDUCAÇÃO
Para a avaliação da educação, o cálculo do
IDH municipal considera dois indicadores com pesos diferentes. A taxa de
alfabetização de pessoas acima de 15 anos de idade tem peso dois e a
taxa bruta de frequência à escola peso um. O primeiro indicador é o
percentual de pessoas com mais de 15 anos capazes de ler e escrever um
bilhete simples, considerados adultos alfabetizados. O calendário do
Ministério da Educação indica que, se a criança não se atrasar na
escola, ela completará esse ciclo aos 14 anos de idade, daí a medição do
analfabetismo se dar a partir dos 15 anos.
O segundo indicador é resultado de uma conta
simples: o somatório de pessoas, independente da idade, que frequentam
os cursos fundamental, secundário e superior é dividido pela população
na faixa etária de 7 a 22 anos da localidade.
Estão também incluídos na conta os alunos de
cursos supletivos de primeiro e segundo graus, de classes de aceleração
e de pós-graduação universitária. Apenas classes especiais de
alfabetização são descartadas para efeito do cálculo.
LONGEVIDADE
Para a avaliação da longevidade, o IDH
municipal considera o mesmo indicador do IDH de países: a esperança de
vida ao nascer. Esse indicador mostra o número médio de anos que uma
pessoa nascida naquela localidade no ano de referência (no caso, 2000)
deve viver. O indicador de longevidade sintetiza as condições de saúde e
salubridade do local, uma vez que, quanto mais mortes houver nas faixas
etárias mais precoces, menor será a expectativa de vida.
RENDA
Para a avaliação da renda, o critério usado é
a renda municipal per capita, ou seja, a renda média de cada residente
no município. Para se chegar a esse valor, soma-se a renda de todos os
residentes e divide-se o resultado pelo número de pessoas que moram no
município (inclusive crianças ou pessoas com renda igual a zero).
No caso brasileiro, o cálculo da renda
municipal per capita é feito a partir das respostas ao questionário
expandido do Censo - um questionário mais detalhado do que o universal e
que é aplicado a uma amostra dos domicílios visitados pelos
recenseadores. Os dados colhidos pelo Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística (IBGE) são expandidos para o total da população municipal e
então usados para o cálculo da dimensão renda do IDH-M.
Com os piores índices de educação e renda, o
resultado na análise do IDH por unidade da federação não poderia ser
diferente: o Pará é o 24º colocado entre os 27, com índice de 0,646. O
pior desempenho foi no indicador Educação, com 0,528. Os estados de
Alagoas e do Maranhão são os dois piores.
Na outra ponta, o Distrito Federal registra
os melhores índices, sendo o IDH mais alto do Brasil, com 0,824, índice
considerado muito alto de desenvolvimento humano. A capital do país
registrou, em 2010, 0,863 no indicador renda, 0,742, no de educação
(alto) e 0,873 no de longevidade. São Paulo aparece logo depois do
Distrito Federal, com 0,783 no IDH-M geral.
(Diário do Pará)
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