Para o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, a troca de colaborações entre Moro e Dallagnol põe em xeque a equidistância da Justiça |
A OAB (Ordem dos Advogados do Brasil) vai recomendar o afastamento temporário de suas funções do ministro da Justiça, Sergio Moro, do coordenador da força-tarefa da Lava Jato, Deltan Dallagnol, e dos demais procuradores da República citados na série de reportagens do The Intercept Brasil o encerramento das investigações sobre o vazamento troca de mensagens.
Em nota divulgada nesta tarde, o conselho federal da entidade defende "investigação plena, imparcial e isenta", diante da "gravidade dos fatos" e do que chama de "possível relação de promiscuidade" na condução de ações penais no âmbito da Lava Jato.
"A íntegra dos documentos deve ser analisada para que, somente após o devido processo legal -com todo o plexo de direitos fundamentais que lhe é inerente-, seja formado juízo definitivo de valor", diz o texto.
A entidade também afirma ter ficado "perplexa" não só pelo conteúdo das conversas gravadas, "que ameaçam caros alicerces do Estado democrático de Direito", mas também pelo fato de autoridades públicas supostamente terem sido hackeadas, "com grave risco à segurança institucional".
Para a OAB, a eventual investigação do caso deve preservar a independência e imparcialidade do Poder Judiciário, a liberdade de imprensa e a prerrogativa Constitucional de sigilo da fonte. "Tudo como forma de garantir a solidez dos pilares democráticos da República."
Mensagens atribuídas ao ex-juiz Sergio Moro e ao procurador Deltan Dallagnol, do Ministério Público Federal (MPF), divulgadas neste domingo (9) pelo site, mostram que os dois trocavam colaborações quando integravam a força-tarefa da Operação Lava Jato.
Moro afirmou nesta segunda (10) em Manaus que não viu "nada de mais" nas mensagens que ele trocou com o procurador Deltan Dallagnol, coordenador da Lava Jato em Curitiba.
"Na verdade, eu me manifestei ontem [domingo], não vi nada de mais nas mensagens. Havia uma invasão criminosa de celulares de procuradores, pra mim isso é um fato bastante grave ter havido essa invasão e essa divulgação. E, quanto ao conteúdo, no que diz respeito a minha pessoa, eu não vi nada de mais."
Questionado se orientou o Ministério Público Federal durante a Lava Jato, Moro disse: "Não tem nenhuma orientação ali. Aquelas, eu nem posso dizer que são autênticas, porque são coisas que aconteceram, se aconteceram, anos atrás. Não tenho mais essas mensagens, não guardo mais registro disso".
Moro, que hoje é ministro da Justiça e Segurança Pública do governo Jair Bolsonaro (PSL), foi o juiz responsável pela operação em Curitiba. Ele deixou a função ao aceitar o convite do presidente, em novembro.
Após a publicação das reportagens, a equipe de procuradores da operação divulgou nota chamando a revelação de mensagens de "ataque criminoso à Lava Jato" e disse que o caso põe em risco a segurança de seus integrantes. Também em nota, Moro negou que haja no material revelado "qualquer anormalidade ou direcionamento" da sua atuação como juiz.
Para o ministro Marco Aurélio Mello, do STF, a troca de colaborações entre Moro e Dallagnol põe em xeque a equidistância da Justiça. "Apenas coloca em dúvida, principalmente ao olhar do leigo, a equidistância do órgão julgador, que tem ser absoluta. Agora, as consequências, eu não sei. Temos que aguardar", afirmou o magistrado.
Nas conversas privadas, membros da força-tarefa fazem referências a casos como o processo que culminou com a condenação do ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva (PT) por causa do tríplex de Guarujá (SP), no qual o petista é acusado de receber R$ 3,7 milhões de propina da empreiteira OAS em decorrência de contratos da empresa com a Petrobras.
O valor, apontou a acusação, se referia à cessão pela OAS do apartamento tríplex ao ex-presidente, a reformas feitas pela construtora nesse imóvel e ao transporte e armazenamento de seu acervo presidencial. Ele foi condenado pelos crimes de corrupção e lavagem de dinheiro.
Preso em decorrência da sentença de Moro, Lula foi impedido de concorrer à Presidência na eleição do ano passado. A sentença de Moro foi confirmada em segunda instância pelo Tribunal Regional Federal da 4ª Região e depois chancelada também pelo STJ (Superior Tribunal de Justiça), que reduziu a pena para oito anos, 10 meses e 20 dias de prisão.
Segundo a reportagem do Intercept Brasil, Moro sugeriu ao MPF (Ministério Público Federal) trocar a ordem de fases da Lava Jato, cobrou a realização de novas operações, deu conselhos e pistas e antecipou ao menos uma decisão judicial. Especialistas em direito disseram à reportagem que não haveria, a princípio, nenhuma ilegalidade, mas pode ter havido desvio ético.
Fonte: FolhaPress
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