quinta-feira, 18 de outubro de 2018

Exclusivo: a história nebulosa do avião que derrubou João Salame de Brasília

Secretário de Comunicação de Marabá, deputado estadual, prefeito e secretário do Ministério da Saúde: a ascensão e queda do autor dos fictícios “500 km de asfalto”.
As investigações sobre uma suposta aquisição de um avião por parte do ex-prefeito de Marabá, João Salame Neto, através de Josimar Eneas da Costa (Eletro), acusado de ser “laranja”, iniciaram no início de 2014, um ano após ele assumir a Prefeitura de Marabá.
Houve uma nota publicada por Zé Dudu e, posteriormente, uma denúncia anônima de alguém ligado ao Aeroporto de Marabá, que repassou informações precisas sobre a periodicidade com que o prefeito, seu irmão Beto Salame e outros políticos ligados a seu grupo utilizavam o avião Sêneca 3, de prefixo PT-VQW entre cidades desta região.
Diante disso, o Ministério Público Estadual abriu Inquérito Civil e começou a investigar o caso.
Curiosamente – ou coincidentemente – a pessoa suspeita inicialmente de realizar a intermediação com a aquisição do avião é um amigo antigo de João Salame: Josimar Eneas da Costa, também conhecido como Eletro, que está preso no Crama, em Marabá, depois de ficar foragido por quatro meses em 2016, se escondendo da Polícia Federal.
Eletro é dono da Mundial Ar Condicionado, uma empresa de pequeno porte nesse ramo, localizada na Folha 28, e ainda da WJE da Costa e Cia LTDA, que fornecia gases medicinais para os dois hospitais de Marabá entre os anos de 2013 a 2016. E, segundo ele disse em depoimento e João Salame confirmou ao blog, os dois são amigos de longas datas, desde antes de o atual prefeito exercer cargo eletivo.
Na investigação do Ministério Público e também da Polícia Federal, posteriormente, ficou evidente que a aeronave descrita acima fora adquirida pelo atual prefeito de Marabá indiretamente, através de Eletro, surgindo certa coincidência quanto à época de aquisição da aeronave e a dos contratos firmados entre a empresa de Josimar e a Prefeitura de Marabá, que depois se comprovaria como superfaturados.
Quem vendeu o avião para Eletro foi a empresa Alta Empreendimentos Turismo Ltda, de Altamira. Em depoimento às autoridades, Paulo Roberto Batista de Souza, proprietário da Alta Empreendimentos, revelou que vendeu o avião para Josemar pelo valor de R$ 700.000,00. O empresário marabaense deu R$ 300.000,00 de entrada no ato da assinatura do contrato, valor que estranhamente foi pago em dinheiro – e não por transferência bancária – lá mesmo em Altamira. O restante ficou de ser pago em quatro parcelas, com quatro cheques de R$ 100.000,00, mas estes não foram quitados.
Outro fato estranho e que deixou os investigadores de orelha em pé é que a maioria dos negócios relacionados a esta aeronave foi realizada através de pagamentos em dinheiro vivo ou depósito em boca de caixa, considerada uma forma de tentar escapar do controle de sua origem, o que aponta para lavagem de dinheiro.
Mas o fato mais intrigante referente à venda do avião ainda estava por vir. O dono da empresa Alta Empreendimentos disse ainda que diante da dificuldade de receber os R$ 400 mil que faltavam, ele enviou um advogado a Marabá para pressionar o empresário Eletro a quitar a dívida.
Como a história de que o prefeito João Salame tinha comprado avião já circulava amplamente na cidade, Josemar apresentou um novo comprador. Era o PROS (Partido Republicano da Ordem Nacional), partido do qual João Salame era presidente estadual à época, e que passou a constar no recibo de compra e venda da aeronave.
Todavia, o curioso é que o saldo devedor passou a ser pago fragmentado em transferências bancárias, com valores de R$ 10 mil, R$ 20 mil, por exemplo, até totalizar os R$ 400 mil. E quem pagou a conta? Não foi o PROS, mas as empresas de Eletro: Josemar Eneas da Costa-ME e Oxipar – Oxigênio do Pará Ltda, sendo que no caso desta última, ele era procurador. Aliás, apenas a título de curiosidade, a Oxipar recebeu cerca de R$ 2,5 milhões da Prefeitura de Marabá em 2014.
Para o Ministério Público, essa estratégia teria sido usada unicamente para despistar o verdadeiro dono do avião. Foram realizadas também transferências de valores arredondados na unidade de milhar ou que estavam pouco abaixo do limite para notificação de operações, indícios de que eram, provavelmente, fruto de infrações penais contra a administração pública.
Os investigadores chegaram a uma dedução inquietante: o PROS, no mínimo, envolveu-se numa transação ilegal, pois teria adquirido uma aeronave com dinheiro oriundo de empresas particulares, as quais, por sua vez, mantêm contratos com a Prefeitura de Marabá. Diante disso, entendem que a compra e a forma de pagamento foram realizadas para encobrir a propriedade do veículo.
Nem a empresa de Josemar nem a Oxipar, que ele representava, tinha capital suficiente para a aquisição de uma aeronave. Além disso, esse veículo não interessava ao tipo de atuação comercial de ambas. E, mais, intermediou o negócio sem demonstrar interesse em mantê-lo em sua posse.

E, num elo mais próximo, os investigadores do MP e PF afirmam que Eletro atuou apenas como “laranja”, a mando do então prefeito João Salame Neto, já que teria sido ele quem negociou a venda do avião para o PROS, não demonstrando nenhum interesse de manter o avião em seu próprio nome, conforme o contrato que assinara em 20 de dezembro de 2013.
Na investigação, as autoridades ministeriais chegaram à conclusão de que a relação entre Josemar Eneas e João Salame eram estreitas tanto na aquisição do avião Sêneca 3 e ainda na sua utilização.
DEFESA DE SALAME
Meses antes de ser preso, ao ser confrontado pela Reportagem do blog sobre a denúncia de que “Eletro” seria seu “laranja”, como as autoridades denunciam, Salame retrucou e garantiu que isso não era verdade e que a negociação para aquisição da aeronave pelo PROS, seu ex-partido, foi direta entre Josimar Eneas da Costa e Eurípedes de Macedo Júnior, presidente nacional da legenda.
Reconheceu que contratou a aeronave de Eletro em algumas ocasiões para voos regionais, mas que sempre pagou pelo serviço.
João Salame Neto é jornalista e editou o jornal Opinião, em Marabá, por mais 20 anos. Ele chegou a ocupar o cargo de secretário de Comunicação do município na gestão de Geraldo Veloso, depois foi eleito deputado estadual por dois mandatos, até alcançar vitória nas urnas para o cargo de prefeito, em 2012, ficando na função entre 2013 e 2016.
Em 2014, sua influência política foi determinante para a eleição de seu irmão e advogado Beto Salame, que devolveu a gentiliza em 2017, quando negociou para que ele ocupasse o cargo de secretário de Atenção Básica do Ministério da Saúde, em Brasília..

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